Luis Moschioni Arroiz

Conheça Luis Moschioni, o Punk Arroiz de Tatuí

Frontside mayday do Luis Moschioni em Maceió, AL. (Fernando Gomes)

Tatuí é conhecida como cidade mais musical do Estado de São Paulo. Essa fama é atribuída ao Conservatório Dramático e Musical Doutor Carlos de Campos, a maior escola de música da América Latina e a mais tradicional do Brasil.

E foi nesse caldeirão cultural que nasceu o talentoso Luis Otávio “Arroiz” Moschioni, um dos skatistas mais autênticos que conheci nos últimos anos e me deixou intrigado desde a primeira vez que o vi.

Pelo skate dele que tenho acompanhado nos vídeos e das vezes que o trombei nos últimos anos, eu tinha muita curiosidade de saber de onde sai tanta criatividade, originalidade e estilo. Então achei que era um bom momento para fazer uma entrevista para ele contar sua história. 

Fui até o restaurante Carrito, onde ele trabalha atualmente, liguei o gravador e conversamos durante algumas horas. 

Ao mesmo tempo que foi fácil entrevista-lo, foi difícil para editar.

Fácil porque ele se expressa muito bem, tem conteúdo interessante pra contar, mas difícil porque ele começa a falar sem parar. 

A transcrição ficou gigantesca, eu resumi e decidi dividir por tópicos.

Ele me sugeriu publicar em duas partes. Mas acho que esses capítulos devem estar juntos, o início e um pouco da atualidade.

Luis Moschioni com o seu primeiro skate, no natal de 1998. (Arquivo pessoal)

O INÍCIO DO LUIS MOSCHIONI NO SKATE

Ganhei meu primeiro skate, presente da minha tia Anete, no dia 25 de dezembro de 1998.

Como uma criança, conheci meu primeiro skate mais como um brinquedo, mas já sabia que gostava desse brinquedo.

Em 2000 meus pais se mudaram para Cesário Lange – cidade natal da minha mãe; skate sempre comigo, lembro que ele era todo da This Way. 

Nesta época foi a descoberta de um novo mundo, vendo que o skate, além de brinquedo individual, me conectava com amigos e lugares.

Com oito, nove anos, eu lembro de ir de skate pra escola. Foi quando eu tive o primeiro tênis de skate também, um Qix Hexagon. Foi a primeira situação como uma criança skatista, tênis furado na escola e tudo mais. Minha trajetória inicial foi assim, mais ou menos em 2003. 

Luis Moschioni com seu mentor de Cesário Lange, Ramon Barros. (Arquivo pessoal)

Nessa mesma época lembro que comecei a frequentar a rua que o Ramon Barros mora. Sem ele o skate de Cesário Lange não seria o que é hoje. Ali colavam todos da cidade para andar. Na casa do Ramon tinha caixote, trilho, caixa de som, cesta de basquete. Tudo isso foi a melhor escola de rua que tive. Ali a galera comentava sobre os vídeos que saiam, música.

O Ramon mandava cartas para as revistas de skate. A mãe dele tem uma lanchonete com banca de jornal na cidade, então ele tinha todas revistas de skate nacionais da época. Era muita informação fresca que vivíamos, mesmo demorando pra chegar pra nós o que acontecia de verdade no game. 

Em 2004, fui pela primeira vez em um campeonato de skate na minha vida. Eu tinha nove anos e foi uma explosão de emoções em um dia como skatista. Vi o Ricardo Pinguim andando, nunca tinha visto um skatista profissional ao vivo! (Renato) Taroman estava narrando e tudo isso numa pista de madeira na rua. Lembro que foi em Tietê. Tudo muito surreal, esse dia eu vi que queria seguir minha vida andando de skate. Ganhei muitos adesivos, vi amigos da cidade vizinha. Depois desse dia eu só queria ir pra campeonatos ver amigos, isso foi doido na minha relação com campeonatos de skate, nunca quis ir pra campeonato pra ver competição, desde criança entendi o quão importante era a confraternização. 

Com dez anos de idade, em 2005, participei pela primeira vez de um campeonato de skate em Tatuí, ainda morando em Cesário Lange. Fui de ônibus com meus amigos. Primeira vez viajando sem meu pai, minha mãe ou responsável da escola. Fiquei em 9° lugar. Dropei de switch de uma quarter pela primeira vez – pra mim isso era manobra da linha; e boneless na volta. Não sabia o que era participar de campeonato mas gostava de me divertir com meus amigos. Desde essa época ficava brisando em qual manobra ninguém tinha dado no campeonato pra mim tentar. Aí sempre eu dava boneless na linha só pra deixar claro que eu era skate punk.

Tudo mudou em 2006, quando minha mãe comprou um aparelho DVD e os vídeos de skate estavam aparecendo em VCD. Tive acesso a biblioteca que formou minha identidade, assistindo desde 411vm issue 64, “Black Out” da Black Label, “Chichagof” da Volcom, “Thats Life” da Foundation, até o momento que o Ramon me mostrou o “Ipath Summer Preview 2005”, que aí sim eu vi que o skate era tudo que eu imaginava e muito mais. Ramon me fez ter noção quem era o Adelmo. Sem a informação que o Ramon me trouxe, não teria o respeito pela cultura de skate que tenho hoje. Foi importante eu estar lá em Cesário, porque era um skate muito simples, era muito cru. Essa base foi muito da hora. Eu era criança e descia ladeira. Muitos moleques hoje não descem. Quando eu era criança, eu descia ladeiras com os caras porque não tinha o que fazer pra andar de skate. Subir e descer calçadas, pular escadas. Isso me ajudou bastante.

Moschioni com Cléber Moura, Ramon Barros, Bruno “ Vermeio” e Bruno Trevisan. (Arquivo pessoal)

Voltei a morar em Tatui em 2008, e assim como em Cesário Lange o Ramon foi meu mestre, em Tatuí o Cleiton Silva apareceu na minha vida, chamando pra andar de skate e filmar nos fins de semana. Foi o mano que me deu a base pra andar de skate na pista, rua, transição e pilhando em filmar, me deu muito gás e inspiração.

TRABALHO EM LOJA DE SKATE

Arrumei meu primeiro emprego, em 2010, numa loja de skate chamada Street Wash Store. Lembro que ia na loja e falava pros caras fazerem campeonato na cidade. O dono falava que não tinha tempo, então eu pedi um trampo. Falei, “deixa eu trampar aí pra você ter tempo, que eu te ajudo no que precisar“. Eu não tinha nem noção. E nesse dia que eu fui na loja, o dono estava fazendo uma coleção (compras) de roupas em Indaiatuba com o representante. Aí eu falei pro dono da loja, “a Vans é aí, e não tem ninguém trabalhando na cidade. Porque você não aproveita?” Meus amigos compravam tênis e vinha a nota-fiscal de lá. Eu falei de moleque doido e o cara viu que eu tinha uma visão de mercado junto do skate. Foi o primeiro trampo, as primeiras oportunidades como skatista e trabalhando dentro de uma loja, vendo como tudo funciona. Acho que isso foi o que virou a chave pra mim como skatista, pessoa, correria, trampo. Tudo aconteceu muito natural. 

Na época da Street Wash, com Jessé , Thiago – que me apelidou de Arroiz; e Kaue Cubas – meu skatista favorito. (Arquivo pessoal)

Com 15 anos, eu não podia nem ser registrado. Na época eu ganhava tipo R$250 por mês, trabalhava de segunda a sexta. E tinha cota de shape, foi uma das coisas que eu mais queria. Tinha um representante que vendia shapes pra loja e começou a me dar shapes. E eu lembro de uma coisa de criança, na primeira vez que eu trinquei um shape eu pedi pro meu pai. Ele falou, “você quer um shape, vai conquistar“. Ele não me deu um shape, foi um baque de realidade, não era como eu pensava. E desde então eu vi o skate procurando oportunidades pra estar andando de skate. Foi uma parada importante na minha vida. Não se apegar em ser skatista, mas procurar meios pra estar andando, estar no meio de diversas formas. Tudo foi natural até chegar aqui. Eu trabalhei cinco anos nessa loja. Comecei trampar com 15 anos, com 17 anos eu fazia as coleções de roupas pra loja. Marco Aurélio, o dono, foi um cara de futebol que gostava de esporte, não era skatista. Ele conhecia a galera do skate, mas fui um moleque que ele se sentiu próximo,  a vontade e abriu os caminhos. Aos 18 anos ele pagou minha viagem pra Argentina, dez dias lá com hotel, tudo. Eu nunca nem imaginava que isso aconteceria um dia, o cara acreditava em mim mais do que eu.  Ele trabalhava em banco na época, tinha uma visão de mercado e acreditou. Me deu as cartas. Fiz campeonatos todos os finais de semana na pista, levava nem que fosse um boné e uma camiseta.

Trabalhando lá foi uma ligação pra estar na pista e ao invés de fazer uma festa, fazia campeonatos de skate. Agregava a galera do rap, do punk. Os artistas pintavam na pista, é de graça, todos mundo podia ir. Era uma parada que fomentava de um jeito simples. A prefeitura ajudava. 

Trabalhando na loja, eles me davam grana pra campeonatos. Eu usava os campeonatos como escape pra conhecer e fazer pontes com a galera. Desde sempre eu andava na rua e sabia que não ia ganhar campeonatos. Então eu estava nos campeonatos pros caras verem meu estilo de skate. Eu pirava nisso. Vários caras que são bem brothers hoje são dessa época. As vezes eu até ia pra final. Era difícil pódio, mas rolava uma vez ou outra, um best trick uma coisa assim. Mas eu sempre estava filmando. Nessa época eu fiz um “5 pra um” pra Black Media, em 2014. Nessa época estava com apoio de shapes da Lombra, que era uma galera do downhill slide de Sorocaba. Os caras faziam os shapes eles mesmos. Eu era amigo deles e foi o primeiro patrocínio de ter cota, fazer um trampo, ir filmar com eles, estava de flow da Sickmind, e estava começando a receber Converse. Eu já tentava fazer outras coisas, buscar outras fórmulas, outros meios. Sabia que em campeonatos não ia ter como.

Uma hora o Marco Aurélio falou, “ou você vai virar dono da loja ou não tem o que fazer aqui. Vai andar de skate, se não der certo, você está com as portas abertas pra voltar“. E ele pagou minha passagem pra Salvador de ida, na primeira vez que eu fui.

Visitando o Pelourinho em 2015. (Fernando Gomes)

CONEXÃO BAHIA

Quando eu saí da loja, em 2015, pra ir em Salvador, o Ivan Ribeiro tinha saído da Converse, estava lá e falou pra eu ir. Eu já tinha conversado com o Felipe (Oliveira), já era amigo dele. Aí fui pra Salvador e fiquei dois meses e meio. Fiquei andando, fiquei na casa do Felipe, fiquei na casa do Helder da ZSU Skateshop. Sempre foi um corre de skate tentando fomentar outras coisas junto. 

Nessa época, 2015 e 2016, foi a época que eu mais andei de skate mesmo. 

PLURAL SKATE

Nessa minha primeira ida pra Salvador o Adelmo estava começando a Plural Skate.

Em 2014 eu tinha trombado o Adelmo na Urb Tradeshow e dei um salve de fã. O Adelmo sempre foi o Lord. Só de ver ele já é uma presença muito forte. Nessa época o Ivan tinha comentado que o Adelmo tinha planos de lançar uma marca de shape e eu pensei, “vou comprar, já sou fã dessa marca“. Depois de um ano o Adelmo perguntou pro Felipe o que ele achava de me colocar na Plural, e ele comentou que sempre me via com o Felipe, e aconteceu.

Fazer parte da marca é algo que não tenho palavras. Um bagulho que hoje em dia sou muito grato de estar nesse game com ele. É o que me dá o ânimo. 

Em 2015 começou esse projeto pra gravar o primeiro video da Plural, pra lançar a marca no fim de 2015. Em 2016 voltei pra Salvador, fizemos a primeira viagem juntos. Fiquei seis meses em Salvador. Fizemos uma viagem no carnaval. Fomos pra Aracaju, João Pessoa, Campina Grande, passamos por Recife. Foram dias de muita aprendizagem, histórias e ouvindo Tribalistas com Adelmo na trip. 

Estive em Salvador por seis meses em 2017, e quando voltei, tive a honra de ser convidado pra uma expo coletiva da adidas, o Show Case.

A Plural lançou o “Singular Vídeo” em 2018. Vivi coisas que ainda estou digerindo. Viajar dias com a família toda foi foda. Só faltou a nave colar pra levar todos!

Luis Moschioni no Carrito Mexican Food. (Sidney Arakaki)

CARRITO ORGANIC FOOD

Em 2019 me mudei pra Sampa e estou aqui trabalhando no restaurante Carrito, que é do (Rogério) Mancha, um cara que é referência. Pra mim, aqui é um trabalho de skate. Estar conversando com ele, ouvindo uns sons aqui, é como se fosse uma sessão. Eu tento lidar com trabalho formal dessa maneira, pra ser divertido igual é andar de skate. Tento transmutar, o que o skate me ensinou, tento trazer pra minha realidade trabalhando. Isso que me ajuda. 

Quando eu estava no interior, eu trabalhava duas semana e vinha pra São Paulo andar duas semanas pra conseguir filmar, estar ativo aqui na cena. Vim morar aqui ciente disso, que teria que me dedicar bastante. Comecei trampando como garçom e hoje ajudo um pouco de tudo. Fecho caixa, tenho a chave aqui do restaurante. Quando começou a pandemia, o restaurante ficou fechado duas semanas. Eu vinha a cada dois, três dias, pra regar as plantas, ver como estavam as coisas. Então é uma relação bem de brother. Eu me sinto como se fosse uma loja de skate.

A ponte que eu tenho aqui, é até mais que numa loja de skate. Aqui eu atendi o Lance Mountain, o Derrick do Sepultura, já atendi o Rodrigo do Dead Fish, já atendi o Jake Johnson, Bob Burnquist

O Mancha me abriu os caminhos pro mundo todo. Receber a equipe da Converse diversas vezes, recebemos equipe da adidas, a equipe dos EUA quando veio pro Brasil colou aqui. Eu respiro skate aqui mais do que nunca, é bem louco isso.

E alimentação faz parte. Isso está sendo bem importante pra mim. Nessa época que eu comecei a ir pra Salvador, morando com uma galera vegetariana foi uma transição de um estilo de vida de família do interior com o estilo de vida próprio do que eu queria comer. E o restaurante apareceu na hora certa. Eu querendo me alimentar melhor, restaurante com comida orgânica. Eu agradeço todos os dias o Mancha e a Camila pelo almoço. Que é o que me mantém andando de skate satisfeito. Eu me sinto como um skatista bem melhor hoje em dia. E trabalhando, não tendo tanto tempo para andar de skate, dou mais valor pelo tempo pra andar de skate do que antes. Eu acho isso muito importante também. Tudo como deve ser, na hora certa, no momento certo. Só agradecer mesmo.

LIBERDADE CONSCIÊNCIA UNIÃO

Quando a Crail lançou o “Crailers”, eu já estava filmando com o Cotinz e o Carrito abriu. Eu trabalho seis dias e no dia de folga eu filmava. Toda folga eu estava tentando ir pra rua com o Cotinz e conseguimos juntar um material. Nisso, uma galera já tinha coisas. Nessas sessões, o Cotinz estava filmando a galera da Crail também. A ideia era ser um projeto maior, tinha umas viagens pra fazer. 

Começou a pandemia, vimos que ia ser impossível até o final do ano e decidimos lançar. Já tinha imagens o suficiente. Eu queria mais coisas, tenho muito mais coisas pra fazer. 

Foi doido, por estar morando com o Cotinz, eu já estava desenhando as paradas do vídeo, e ele me dava umas ideias. Na edição dos sons a gente escolheu tudo junto.

O Cotinz editando é excepcional. Eu mandei o Charlie Brown Jr, o som “A União Prevalece”, por que não tem nem o que falar, o som é com o De Menos Crime, carai. E os outros eu estava ouvindo e vimos que ia encaixar, ae vimos os nomes das músicas e assimilou. “Liberdade, Consciência e União”. O nome do som do Jean Spinosa é Libertar nossas correntes, do Gritando HC. Da parte do Guega com o Rato é do Consciência Humana e da minha parte é União, do Charlie Brown Jr. Foi essa brincadeira, tudo aconteceu. Tudo muito skateboard. 

Engraçado também é que quando a parada é muito skate, a galera não usa, né? O Charlie Brown fala tanto de skate, que não vai ficar tão legal num vídeo. O Gritando HC foi tão assimilado com skate que as vezes a galera não quer usar. Foi um bagulho que eu ouvia quando era criança, um bagulho de skate mais puro mesmo. Isso que eu queria transmitir, sem muita frescura. Foi tipo foda-se, é isso que ouvia na sessão, ninguém é cult aqui.

Ollie sobre um corrimão em Tatuí. (Arquivo pessoal)

CONSERVATÓRIO DE TATUÍ

Lá em Tatuí tem o conservatório, a cidade é conhecida como Capital da música. Na época da escola não tinha umas coisas ligadas ao conservatório. Mas com 15, 16 anos, eu tinha amigos na escola que estudavam no conservatório e andavam de skate. Isso foi um bagulho que eu assimilo e levo comigo até hoje.

Eu escuto Hermeto Pascoal. Não é um som que a galera do skate escuta, mas lá, é comum trocar ideia. Sem querer, tive influência do conservatório da cidade. Cresci junto na cena mais do punk, ia bastante em festivais de punk. E conhecendo essa galera do som, conheci as paradas de jazz. 

Quando eu comecei a andar de skate e via o Paulo Diaz, eu já lembrava do conservatório, a dança, os braços girando.

Tem um brother que é do Wu Tang Clan Brasil América Latina que é de Tatuí, o Visel MC. Os primeiros campeonatos que eu ia, ele ia junto com a galera do skate pra cantar nos eventos. Eu estive muito na casa dele vendo as produções e corres, um cara ligado aos caras do Wu Tang Clan. Tatuí me deu essa oportunidade de estar conectado com essa galera. 

Os primeiros pixos no skate. (Arquivo pessoal)

ARTE

Eu tenho uma relação com a arte desde criança. Com oito anos, quando eu comecei a andar de skate, eu lembro de ver um amigo fazendo uma letra de pixação. E me marcou como fazer uma letra, o jeito de montar uma letra de pixo. E isso eu sempre levei comigo, desde criança. Quando eu tinha 12 anos, em Tatuí, tinha uma galera da escola que já tinha uma crew, uns moleques que pixavam, faziam bomb. E eu tive essa relação com pixação e grafitti, de moleque. Eu andava de skate, jogava basquete e pixava, fazia bomb. Estava começando uma relação. Sempre tive essa afinidade com arte. Mas morando com o (Fernando) Denti foi uma lapidação bizarra. Foi pra saber o que eu estava fazendo e pra onde iria. Eu tinha uma visão de skate, ele tinha a visão de arte, de música, do mercado de onde ele trabalhava. Eu ficava na casa dele e foi um bagulho que destravou minha cabeça. Foi muito importante. Fui com ele no atelier do Sesper, via ele fazendo um som. Comecei a ver o skate de outra maneira. Me mostrou que o skate tem um ritmo de remada, ritmo de manobra. A gente constrói uma linha, é igual construir um som. Então tem ritmo, tem tempo, tem harmonia. 

Junto disso, morando com o Felipe, andando com o Akira (Shiroma), (Alexandre) Cotinz. Foi uma outra dimensão, do nada estava com os melhores amigos lá no interior e chegando aqui em São Paulo, estava com a galera que eu admirava quando estava lá. A vida me deu vários presentes. 

O skate foi a base para me aproximar da música. O skate que me identificou do rap, do punk, aquela coisa de criança ver o skate punk e skate rap. Mas eu já sabia que gostava de skate. Gostava dos sons de rap que estavam nos vídeos. Comecei a ver os iPaths, os caras mais do reggae. Eu vi a influência da música no skate. Isso foi um bagulho que me ajudou. 

Quando criança, eu ouvia mais punk rock, foi uma parada dos meus pais de ouvir rock clássico. Então eu já tenho isso de infância. Meu pai conta que quando eu tinha dois anos ele me carregava no colo escutando Pink Floyd pra dormir. Então eu já tenho essa ligação da família com som. Eu lembro do meu tio escutando Metallica na casa. Eu sempre tive essa ligação da música na família, depois da cidade, com os amigos e fui me aprofundando. A música e o skate andam muito juntos, abre os caminhos como pessoa. Ouvindo Cólera e pensando numa parada ecológica, ouvindo Bulimia e falando do feminismo. O punk sempre esteve ativo nas paradas de gênero, de tudo do independente. A música me ajudou bastante como skatista também, tudo se complementou.

Quando eu conheci o Denti aqui em São Paulo ele era o cara mais da música e estava no skate. Foi um amigo de muita troca de ideias, de aprender mesmo. Morando com o Denti, ele me destravou pra realidade. 

PAZZ E JAZZ

Pazz e Jazz é um projeto pessoal. É o que eu assino, como tento refletir o que eu vejo. Não como marca, mas como um movimento. A paz de um estado de espírito com as coisas e o jazz, que é um som quebrado, torto, que não tem uma forma mas ele é harmônico. Eu enxergo a realidade como um jazz. A vida não é como a gente quer, mas a gente aceita, se harmoniza. É como eu me expresso, eu acho. 

Lá em Tatuí, na época que eu ia pros campeonatos, tinha o Diego Dedablio. E ele sempre assimilou a música na arte na cidade. Sempre teve os murais dele gigantescos com gente tocando batuque, tocando saxofone, tocando flauta. Foi um cara que me abriu as perspectivas como arte. Eu gostava de pixação, graffitti, mas o que ele fazia era um bagulho muito além. Ele colava com a galera do skate e foi minha influência. Se hoje eu faço saxofone como logo na pixação, é por causa dele, que fazia trompete na cidade. Pra mim, essa é minha forma de expressar, essa influência que eu tive dele. Eu converso com o Diego até hoje, um artista cabuloso. As coisas que eu mais admiro de arte são dele.

E hoje em dia, o Paz e Jazz que eu faço é isso, um reflexo do que eu vejo como skate, arte, uma estética de tudo o que eu vivi, com vídeos de skate. E eu estou fazendo uma coleção com a De.Part Caps. É a forma de me expressar e me unir com meus amigos.

PUNK ARROIZ

Arroiz é o da esquerda (Arquivo pessoal)

Quando eu tinha oito pra nove anos, quando eu comecei a colar na rua do Ramon pra andar, eu tinha um moicano. Eu já ouvia uns sons, já gostava de Ramones e Sex Pistols com nove anos. Um dia, chegando na rua, o Tiago – que é um mano que hoje mora em Sorocaba; falou, “olha o punk arroz chegando“. 

O que eu lembro, de memória, a primeira vez que me chamaram de arroz foi isso. E desse dia em diante começou, “punk arroz”. Era punk arroz no início. 

Quando eu era criança, eu só comia arroz e mistura. Eu não comia salada, eu não comia fruta. Não sei se minha mãe falou pra eles e eles começaram a me zuar ou se foi porque eu era uma criança, um pivete punkinho. Aí eu fui pra Tatuí e a galera me chamava de Arroz, Arroiz, depois virou Rice. O Lucas Utida, que mora no Japão, me chama de Gohan. 

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